Pedro Roque: “Gosto de transmitir aquilo que a banda me faz sentir”

Na fotografia ou na música, Pedro Roque tem vindo a deixar a sua marca nestas artes, que estão constantemente interligadas ao longo da sua vida. Fotografa para a revista LOUD! desde 2013 e lançou este ano o seu mais recente projecto musical, CAVERNANCIA, que poderá ser escutado na ZDB, no dia 27 de Novembro.

Viveste grande parte da tua infância e juventude no Pinhal Novo. Como surgiram os primeiros contactos com o Barreiro?

Eu tinha uma avó que vivia na avenida do Bocage, ao pé do antigo Bingo, e passava grandes temporadas de férias lá em casa. Na altura passa muito pelo Parque Catarina Eufémia e assim. Mas a ligação forte com o Barreiro começou na adolescência, quando comecei a frequentar o Barreiro à noite, para ver concertos, especialmente no El Matador. Apanhava o comboio e vinha todos os fim-de-semanas curtir, cheguei a vir sozinho e tudo. Foi assim que se despertou o meu interesse pela cidade e também pela música underground. No Pinhal Novo não se passava grande coisa e por isso comecei a vir para aqui bastante. Cheguei a tocar no El Matador antes de fechar.

E a música surgiu antes da fotografia?

Sim, apesar de que eu fotografo desde miúdo, mas por brincadeira. O meu pai tinha câmaras em casa e tenho um padrinho que é fotógrafo. Mas só me despertou essa vontade mais a sério quando comecei a ver bandas. Tive uma primeira banda com os meus 16 anos mas depois terminou e só voltei a ter outra passado uns quatro anos. E nesse tempo pensei que tinha de fazer algo para fazer parte daquilo. E foi ai que comecei a fotografar bandas. Comecei no OUT.FEST, em 2007, e Barreiro Rocks também.

Barreiro Rocks

Gostas de fotografia mas sempre com o foco na musica: reportagem musical, concertos.

Sim, apesar de que com o passar dos anos comecei a fazer outras coisas. Gosto de fotografia de rua. Mas o foco foi sempre os concertos. O objectivo foi sempre documentar essas experiências musicais, até que comecei a colaborar com fanzines e revistas, como a LOUD!, onde colaboro há já alguns anos. Depois trabalhar com bandas ou festivais directamente. De Norte a Sul, e lá fora também. Estou a fotografar bandas desde o final de 2006, assim de uma forma mais profissional.

Como se deu a tua entrada na LOUD!, que é actualmente a única revista de música em Portugal?

Foi algo natural, eu já fotografava para alguns sites e fui conhecendo malta da redação. Começou por ser um pouco para os desenrascar no início até que tiveram condições para me pagar e comecei a fotografar oficialmente para eles em 2013.

Que concertos fotografaste lá fora?

Por acaso, a minha entrada para a LOUD! deu-se na altura em que fui fotografar o HellFest, em 2012. Na altura fiz uma proposta à revista porque eu ia de qualquer das maneiras fotografar as Twisted Sisters. Eu propus fazer uma reportagem do festival e fazer um report de viagem do festival, e a partir daí comecei a minha colaboração na LOUD!.

Hellfest

Como é que vês actualmente a posição do fotografo de concertos, num momento em que qualquer pessoa tem uma câmara no bolso? Como lutas contra esta tendência?

Eu mantenho sempre a minha premissa. Quando me contractam, já sabem que as fotos vão ser a preto e branco. É a minha cena. Pelo que eu sinto, contractam-me muito pela minha estética, assim mais crua e forte. Portanto tento sempre fazer algo mais “artístico”. Não ser apenas uma fotografia “normal”. Gosto de transmitir aquilo que a banda me faz sentir.

Porquê sempre o preto e branco?

Eu escolhi o preto e branco porque comecei a fotografar em caves muito escuras, e era um truque para disfarçar e tentar safar a coisa. Mas acho que é a questão de ser tudo neutro. É um retrato mais real, não há truques. Eu fotografo logo a preto e branco na câmara. É uma estética mais verdadeira, para mim. Sempre gostei de ver fotografias a preto e branco e tem que vir muito com as minhas bases, também.

Portanto tem uma lógica e influência nas tuas primeiras bandas.

Sim, sim. As minhas primeiras bandas foram de punk e hardcore, e mais tarde entre o grindcore e o metal. Mesmo capas de discos, sempre gostei desta estética. Se me pedirem uma coisa a cores, eu faço. Aqui há uns tempos a LOUD! pediu-me para fotografar os Iron Maiden ao Altice Arena e tinha de ser a cores. Pronto, e assim foi, mas depois no meu blog passei tudo para preto e branco. Mesma a minha forma de pensar quando estou a fotografar é sempre tendo em conta o preto e branco.

Achas que dá mais liberdade a quem vê as tuas fotografias de poder imaginar quais as cores que estão ali, na realidade?

Exactamente. Eu acho que para contar a história, é uma estética mais verdadeira. É mais por aí.

OUT.FEST

Tens também uma grande paixão pela música, além da fotografia.

Sim, desde miúdo. Acho que até apanhei tarde, porque os meus pais sempre ouviram música. Desde Pink Floyd, Led Zeppelin, Deep Purple, Prince, Iggy Pop até David Bowie. Mas só começo a ter um verdadeiro interesse pela música aí aos 13 anos. E quando comecei a escavar, foi por aí fora. E mesmo entrar em bandas, foi algo por acidente. Eu não sabia tocar nada e tinha uns amigos meus que me pediram para ir para a vós, e entrei assim. Ainda que o que estou a fazer agora não tem nada a ver com esses primeiros projectos. É uma cena mais electrónica e experimental. Mas está a ser um grande desafio, pois sempre foi uma estética que me interessou e comecei assim o CAVERNANCIA.

De onde vem o nome CAVERNANCIA?

É uma cena de miúdos. Eu fiz bodyboard muitos anos e quando via uma onda muito grande eu dizia sempre à malta que vinha aí uma onda com uma grande cavernancia, o que quer que isso seja. E sempre fiquei com a palavra na cabeça para usar um dia, e acho que se adequa ao tipo de som que estou a fazer, que é algo cavernoso.

É algo puramente instrumental, até agora.

Sim, até agora. Estes sons que estão no “Em Ciano”, o meu primeiro álbum, são essencialmente field recordings, sons de transportes e do meu dia-a-dia. O disco chama-se me “Em Ciano” porque eu vou muito cedo trabalhar e aquela cor que eu via no barco aos meus olhos era ciano. E 90% dos sons que estão ali são sons ambientes desses percursos e viagens. Muitos sons aqui do Barreiro, também.

Neste momento, também já estas a viver no Barreiro. Porque escolheste o Barreiro?

A escolha foi simples. As rendas no Barreiro eram mais acessíveis do que em Lisboa. E eu já vinha muito ao Barreiro. Passava cá sempre os fim-de-semanas e já conhecia muita gente. Sempre gostei desta micro cena em que há sempre coisas a acontecer. E aproximei-me mais da malta da OUT.RA e do Barreiro Rocks, e consigo integrar-me rapidamente na comunidade. Há malta de cá que acha que eu sempre fui de cá, mas só vivo cá há cinco anos. Agrada-me muito o espírito de comunicada que existe aqui. As pessoas unem-se muito para fazer coisas. Há muitas associações e isso é óptimo. Não é por acaso que fiz questão que o meu primeiro concerto fosse aqui.

E como correu?

Contactei o Vítor Lopes, da OUT.RA, e contei-lhe o projecto. Ele sugeriu aquela armazem, na Baía do Tejo, e foi o local perfeito para me estrear. Estava um bocado acagaçado, até porque o público estava disposto num semicírculo à minha volta. Mas no geral correu bastante bem, até porque abriu portas para outros concertos.

E próximas datas?

Toquei na Parede, na SMUP, com o Jerome Faria, depois também já toquei na Igreja St George e agora vou tocar no dia 27 de Novembro, com os 10 000 Russos, na ZDB. Por isso estou com uma agenda bastante composta. Vou tentar também dar alguns concertos no Norte.

Como vês o panorama cultural aqui da cidade, actualmente?

Eu acho que faltam ainda mais espaços de encontro para se discutir e falar sobre música ou arte. Não há muitos pontos de encontro. Tens a Locomotiva e ADAO mas depois são coisas espontâneas. Antigamente havia muito mais, a malta reunia-se mais, mas também porque existiam mais espaços que potenciavam isso. A ADAO está a fazer esse trabalho de voltar a reunir gerações e malta mais nova para criar, mas creio que ainda são precisos mais.

Tens ainda algum projecto pessoal pensado para fazer e que esteja na gaveta?

Tenho. Uma das coisas que me falta fazer é ir em tour com uma banda e registar tudo. Meter-me dentro da carrinha e ir com eles para documentar tudo o que acontece. Isso e um livro, que está em águas de bacalhau, porque eu gosto muito do formato físico. Gosto muito de ver as fotos impressas. Eu costumo até dizer que “only print is real”.

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